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sábado, 12 de abril de 2014

Espiritualidade

 
Os dias de hoje são cheios de intranquilidades e angústias no cenário mundial. Em todas as nações, das mais às menos desenvolvidas, existem problemas ligados à falta de amor, paz, justiça, entendimento, humildade, dentre outros valores. Percebe-se que há uma supremacia dos valores materiais sobre os espirituais, e em conseqüência disso, o ‘caos’ que envolve todo o mundo. Em nossa sociedade hodierna encontramos clamores que anseiam por paz e amor, mas não se percebe uma iniciativa da própria sociedade pra promover tais valores. A questão da espiritualidade é muitas vezes confundida com a religião, doutrina, dogma ou seita. A espiritualidade não é vista como algo de suma importância, pois alguém que tenha a sua ‘espiritualidade’ em dia será uma pessoa consciente dos valores necessários para o bem comum. Ser ‘espiritual’ não é o mesmo que ser religioso, mas ser revestido como uma ‘luz’ que clareia a escuridão das ‘trevas’ que nossas angústias e aflições nos causam. Uma ‘luz’ acintosa no ‘fim do túnel’ para quem deseja encontrá-la. Desse modo, perguntamos: O que é espiritualidade? Como podemos desenvolvê-la? Qual a sua importância para nós? Traremos algumas respostas para tais questões a fim de que as pessoas, sejam quem for e qual situação enfrentam no presente momento de suas vidas, possam ter uma melhor compreensão e assim sejam ajudadas para suportarem o momento difícil que atravessam. Questiona-se: o que é feito pelas Instituições e pelo sistema carcerário para promover esta espiritualidade? Há tal espiritualidade no sistema carcerário? É notório a necessidade de um trabalho especialmente voltada para este fim, trabalho este que deve ser realizado por pessoas comprometidas com a causa do próximo, que sejam ‘guiadas’ por Deus e aptas para tão importante ocupação, a fim de que tantas pessoas que estão em privação de liberdade, bem como as que se julgam ‘livres’ e saibam que possuem uma ‘inteligência’ espiritual e que devem estimular as mesmas. Assim poderão colher os ‘frutos’ do amor, paz, compreensão mútua, fraternidade, alegria e o da verdadeira ‘liberdade’. Procuramos aqui, a partir das questões levantadas, contribuir com novas propostas que venham a possibilitar um maior conhecimento acerca do que seja espiritualidade e, consequentemente, que as pessoas que vivenciam o cotidiano carcerário(ou outros tipos de ‘prisão), possam desenvolvê-la o melhor possível, conscientizando-se que isto poderá lhes proporcionar um maior equilíbrio, tranqüilidade e paz consigo mesmo, além do fato de que tal condição poderá refletir num melhor relacionamento com os companheiros, com a família, amigos e funcionários das Instituições em que se encontram em privação de liberdade. Com certeza, quanto maior for o grau de ‘inteligência espiritual’ das pessoas, menores serão os problemas a serem enfrentados por todos. É preciso que todas as pessoas, sejam quem for, saibam que há um Deus que contempla a tudo e a todos, e que deseja que o encontrem para que sejam abençoados por Ele. Os dias de hoje estão marcados pelas dificuldades e pelas complicações pertinentes à humanidade ‘pós-moderna’. Pobreza , fome , miséria, políticas públicas incapazes de deterem o crescimento de tais coisas, economia monopolizadora, especulativa, ‘escravista’ e ‘marginalizadora’, a violência ‘epidêmica’ e crescente, a corrupção dos valores e das relações sociais, demonstram o quadro decadente da humanidade. Entretanto, entre o ‘povo de Deus’ (a Igreja), nota-se uma certa frustração no que diz respeito à alienação aos problemas enfrentados pela humanidade. Incrível como os ‘fiéis’ prendem-se à ritos e doutrinas puramente religiosas sem compromisso com às necessidades humanas. Não vamos encontrar nos textos bíblicos o termo ‘espiritualidade’. Nem se sabe ao certo sua gênese, embora tenha aparecido juntamente com as ‘organizações’ religiosas nos primeiros séculos da Igreja cristã. Hoje em dia, fala-se comumente que ser ‘espiritual’ é viver ‘religiosamente’ a vida cristã, ou seja, para ‘ser’ espiritual é preciso viver alienado às coisas materiais e ao mundo. No sentido bíblico, o termo ‘espiritualidade’ significa um viver ‘segundo o Espírito de Deus’. Podemos ver, desde os Patriarcas, passando pelos Juízes, alguns Reis, Profetas, Jesus e os Apóstolos, pessoas ‘conduzidas’ pelo Espírito Santo para viverem conforme os ‘parâmetros’ de Deus e poderem executar com sucesso as ‘missões’ de cada um ‘ordenadas’ por Ele. Em outras palavras: a vida ‘segundo o Espírito’ não é estática, fria, presa à tradições ou à costumes religiosos, mas é viver livre de religiosidade, de forma profunda e dinâmica, no seguimento de Jesus, isto é, uma verdadeira ‘conversão’ ao estilo de vida segundo Cristo. É viver na busca de soluções para as necessidades da vida humana. Isto sim, é espiritualidade. A espiritualidade representa uma ‘volta’ ao aspecto subjetivo e, de modo mais profundo, buscar captar os ‘fenômenos’ espirituais independentemente da lógica das palavras. O homem que busca e procura a Deus, descobre certas ‘vias’ para acessar ao conhecimento de Deus, através da espiritualidade. A pessoa humana é capaz de compreender a ordem das coisas estabelecidas pelo Criador, indo ao encontro do seu verdadeiro ‘bem’ – DEUS. Só podemos viver plenamente a vida, se a vivermos intimamente relacionadas com Deus através da espiritualidade. Então estaremos na dimensão que Jesus deseja que alcancemos, pois devemos “adorar a Deus em espírito…” (C.f. . Jo 4,24) 6.1 – O SENTIDO E A IMPORTÂNCIA DA ESPIRITUALIDADE Não é muito fácil falar sobre espiritualidade. Busca-se, nos dias de hoje, uma espiritualidade que satisfaça, preencha, arrume ou que junte os ‘pedaços’ de nossas vidas. Nunca se viveu um momento em que nos são oferecidos inúmeras e variadas opções de ‘entretenimento’, visando o lazer, a diversão, o descanso da pesada rotina do cotidiano alucinante que nos é imposto pela sociedade ‘pós-moderna’ de nossos dias. O curioso é que, ao mesmo tempo, jamais as pessoas se sentiram tão vazias, ‘ocas’, sem-sentido. As opções que lhes oferecem não são suficientes, nem tampouco eficazes. Nos sentimos cada vez mais ‘sufocados’, mais ‘pressionados’, como que estivéssemos carregando pesados fardos em nossos corações, ao invés de ser nas costas, o que aumenta ainda mais a sensação de incômodo, de fadiga, de aperto no peito. Um dia chama o outro, a noite chama a próxima, os dias vão e vêm, assim como os meses e os anos. O tempo parece ser cada vez menor, tem-se a impressão que estamos sempre apressados e atrasados para alguma coisa. Também nos parece que as coisas nunca vão acontecer ou, então, demoram demasiadamente. É impressionante o ritmo alucinante em que a maioria das pessoas impõem ou se deixam impor às suas vidas. Somos cada vez mais intolerantes, estressados com as outras pessoas, ao mesmo tempo em que nos sentimos cada vez mais carentes, mais ‘ deprê ‘, mais exigente para que os outros nos compreendam, nos dê sua atenção, nos ajudem. Mas por quê estas coisas acontecem? Porque as pessoas costumam reter suas aflições, seus suspiros, seus sofrimentos, suas dores, seus gemidos por aquilo que necessitam com urgência, algo que não se trata apenas de alimento, moradia, segurança, justiça, emprego, educação, paz, etc. Porque sentem falta de algo mais contigente, mais profundo: a espiritualidade. Nos dias atuais, vemos uma sociedade mercantilista, capitalista, consumista, imediatista, ‘neo-liberalista (quantos ‘istas’!), alienada e ‘super-cultuante’ do ‘ter’ ao invés do ‘ser’, e, ainda, ‘esfacelada’, insatisfeita e vazia de sentido. Nossa sociedade hodierna não consegue contemplar qual caminho precisa trilhar para ‘escapar’ do ritmo frenético em que vive, um caminho que possa lhe conduzir a um refúgio de paz, sossêgo, tranqüilidade, oração, um lugar de encontro consigo mesmo e com o Transcendente: DEUS. Hoje em dia, tornou-se um grande desafio, para a maioria das pessoas, encontrar o caminho que lhes possam levar à transcender para a paz. A espiritualidade nos traz ‘condensação’, densidade, estímulo, sentido, emancipação, direção e perspectiva à vida humana. Observando as pessoas que vivem em situação miserável, tais como os ‘sem-teto’, menores abandonados, favelados, presidiários e ex-presidiários, etc., podemos ver que tais pessoas sofrem muito por causa da situação em que se encontram, mas podemos ver também que encaram a situação em que vivem de uma forma bem-humorada, até brincando com a mesma. Por outro lado, vemos, nos supostos lugares em que as coisas deveriam ser melhores (inclusive mais repleto de espiritualidade), uma certa ‘euforia’ por parte dos ‘irmãos’ que rezam (ou oram), cantam, pulam, batem palmas, gritam de ‘júbilo’ (até dançam!), ao tentarem propagar uma certa espiritualidade durante os cultos e as cerimônias, embora não vejamos tal prática vivenciada no cotidiano fora dos templos e das congregações. Até mesmo é difícil encontrar tais irmãos no dia-a-dia, nas ruas. Parecem até que são ‘agentes secretos’ das religiões. A respeito disto, surgem os questionamentos: Será que somente há espaço para a verdadeira espiritualidade nos locais de cultos ou de cerimônia religiosas? Por quê as pessoas costumam ligar espiritualidade à religiosidade? Por quê achamos que onde há miséria, opressão, desordem, não pode haver espiritualidade? Será que os pobres, oprimidos, marginalizados, presidiários, ex-presidiários, estão privadas de vivenciarem a espiritualidade? Precisamos sair das ‘prisões’ que nós mesmos nos impomos, e das ‘muralhas’ que construímos, em que tais coisas apenas servem para nos afastarmos dos outros, e, por conseguinte, de Deus. O que precisamos é tomar posse daquilo que Paulo diz: “Todos os que são guiados pelo Espírito de Deus são filhos de Deus. E vocês não receberam um Espírito de escravos para recair no medo, mas receberam um Espírito de filhos adotivos, por meio do qual clamamos: Abba! Pai!”[1] E, ainda: “De fato, Deus não nos deu um Espírito de medo, mas um Espírito de força, de amor e de sabedoria.”[2] Desse modo, sairemos da nossa ‘timidez’ espiritual e da nossa alienação religiosa, e deixar de acreditar que por meras orações (ou rezas), músicas ‘gospel’ ou sacras e afins, nos levarão ao Absoluto. Precisamos nos purificar do ‘lixo’ depositado na ‘rampa’ dos nossos corações (hipocrisia, preconceito, discriminação, etc.), para termos acesso ao caminho que nos leva à verdadeira espiritualidade: JESUS. Lembrem-se do que Ele disse: “Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida.”[3] A verdadeira espiritualidade nada mais é do que ter fé na vida, principalmente quando as coisas não estão indo muito bem. A nossa breve existência, com os seus revezes e suas alegrias, com as nossas quedas e fraquezas, precisa ser vivida ao máximo, em que não podemos ter o luxo de perdemos tempo com futilidades. O ‘show da vida’ tem que continuar, apesar dos pesares. A espiritualidade deve estar ligada à condição e à situação da vida humana. A maioria das pessoas que estão em privação de liberdade, não estão apenas privadas do direito de ‘ir e vir’. Estamos privados de uma alimentação decente, de atendimento médico, jurídico, da companhia dos amigos, familiares e parentes, de trabalho, de educação, etc. No entanto, a vida precisa e tem que continuar, seja qual for a situação em que possamos nos encontrar. Prova disso, é que hoje estamos desenvolvendo este trabalho, porque temos fé na vida, e fé que ainda existe sentido de viver. Por termos fé, e fé em Deus, apesar da restrição do espaço físico e da privação de liberdade, não nos conduzimos e nem deixamos nos conduzir à barbárie, como muitas pessoas pensam. Ao contrário, mesmo privados de muitas coisas, continuamos lutando para uma vida melhor para nós que fazemos esta obra, e para aquelas pessoas que não desistiram de viver. Graças a Deus, que Ele não privou ninguém da Sua Graça, do Seu Amor, da Sua Bondade, da Sua Misericórdia, da Sua Compaixão. Muitas pessoas olham para aqueles que estão nas prisões com os olhos ‘atravessados’, mas, felizmente, “Deus não vê como o homem(…)” [4]. Muitos acham que a prisão não é um local adequado para se vivenciar a espiritualidade. Mais uma vez recorremos à Palavra de Deus: “(…)mas, onde foi grande o pecado, foi bem maior a Graça…”[5] Deus não se encontra fora e nem sem o mundo. O nosso Deus é ‘invisível’, mas real e nos acompanha em nossa caminhada todos os dias. Não se pode conhecer este Deus se não estivermos intensamente ligados a Ele numa profunda e sincera espiritualidade. Somente O conheceremos se assumirmos os desafios que a vida nos apresenta, em que neles poderemos ver a Face do Ressucitado – Jesus Cristo – ícone do amor, da justiça, da paz, do perdão, da Graça e da esperança para os que sofrem. É o Deus Filho que venceu a cruz e se faz presente no meio das pessoas oprimidas, presença esta que faz com que nossa esperança seja renovada a cada dia. Todavia, estas coisas só acontecerão se estivermos vivendo no Espírito de Deus, o qual nos faz reconhecer que somos livres por sermos “criados à sua imagem e semelhança”(Gn 1,27), que somos seus ‘filhos’ e ‘irmãos’ uns dos outros. Quando andamos no seguimento de Jesus, somos levados ao encontro com o Deus Pai, ao mesmo tempo em que somos ‘capacitados’ para executarmos nossa missão como cristãos. Por causa disto, constantemente devemos nos perguntar a respeito daquilo que Deus requer de nós neste mundo cheio de conflitos no qual vivemos. O desenvolvimento de nossa espiritualidade nos ajuda a romper as estruturas de poder que encontram-se dentro de nós. Faz com que possamos derrubar as ‘muralhas’ do orgulho, da ira, da vaidade, da inveja, do rancor, do preconceito, da discriminação, da indiferença, etc. Para tal desenvolvimento, precisamos “olhar para Jesus, Autor e Consumador da nossa fé” (Hb 12,2), o nosso ‘ponto de partida’. A fé em Jesus Cristo é o que precisamos para que tenhamos sucesso em nossa missão cristã. Aliás, a missão de evangelizar é o mister da Igreja cristã, pois o próprio Jesus nos comissionou para tal evangelização, ao ordenar: “Portanto, vão e façam com que todos os povos se tornem meus discípulos(…)”[6] Desse modo, a espiritualidade é um incentivo para que nos ‘alistemos’ ao ‘exército’ de Cristo, dando continuidade ao Seu projeto de libertação e de salvação aos que necessitam. Pela espiritualidade traçamos o caminho que nos leva à servir os ‘irmãos’. Por ela, somos ‘livres’ para exercermos nossa liberdade em Cristo, expressando para as pessoas que sabemos ser amados incondicionalmente por Ele, e que tal amor é ofertado para todas as pessoas, sejam quem for. Pela espiritualidade somos feitos ‘militantes’ do Reino de Deus, comprometidos com as necessidades do povo, principalmente os mais pobres e oprimidos. É fundamental entender a mensagem cristã e conhecer as necessidades das pessoas. Como ‘obreiros’ de Jesus, tal como Ele, devemos ser os ‘porta-vozes’ da esperança, trabalhar com a finalidade de que o povo tenha sua esperança realizada e podermos construir um mundo melhor. Pela espiritualidade ainda podemos nos sentir pessoas melhores, alegres, cheias de ternura, de amor, ‘mensageiros’ da Palavra de Deus, sempre trabalhando para que se tenha um novo mundo, livre das desigualdades e das injustiças. Para isto, precisamos estar revestidos de um sério compromisso com a vida humana e em espírito de oração, outro poderoso instrumento para o desenvolvimento e exercício da espiritualidade. Pela oração, fazemos ‘contato’ direto com o Deus Pai, fortalecemos nossa espiritualidade e assumimos verdadeiramente o nosso papel de verdadeiros cristãos, seguidores de Jesus Cristo. Ser espiritual não significa estar alienado do mundo. Não significa estar horas a fio em ‘meditação’. Ser espiritual é estar consciente dos conflitos do mundo e da vida humana, é sofrer com os que sofrem, sorrir com os que sorriem, chorar com os que choram. Em outras palavras, a espiritualidade nada mais é do que se sentir vivo e viver a vida com vida. A espiritualidade é importante por que nos faz sentir humano, situado numa realidade concreta, e não num ‘conto de fadas’, mas somos plenamente conscientes de nossas virtudes e dos nossos defeitos, daquilo que podemos fazer para melhorar não apenas a nossa condição de vida, mas principalmente a dos outros. [1] Rm 8, 14-15. [2] 2 Tm 1, 7. [3] Jo 14, 6a. [4] C.f. 2 Sm 16, 7 [5] C.f. Rm 5, 20. [6] C.f. Mateus 28,19.

segunda-feira, 24 de março de 2014

Espiritualidade

Os dias de hoje são cheios de intranquilidades e angústias no cenário mundial. Em todas as nações, das mais às menos desenvolvidas, existem problemas ligados à falta de amor, paz, justiça, entendimento, humildade, dentre outros valores. Percebe-se que há uma supremacia dos valores materiais sobre os espirituais, e em conseqüência disso, o ‘caos’ que envolve todo o mundo. Em nossa sociedade hodierna encontramos clamores que anseiam por paz e amor, mas não se percebe uma iniciativa da própria sociedade pra promover tais valores. A questão da espiritualidade é muitas vezes confundida com a religião, doutrina, dogma ou seita.
A espiritualidade não é vista como algo de suma importância, pois alguém que tenha a sua ‘espiritualidade’ em dia será uma pessoa consciente dos valores necessários para o bem comum. Ser  ‘espiritual’ não é o mesmo que ser religioso, mas ser revestido como uma ‘luz’ que clareia a escuridão das ‘trevas’ que nossas angústias e aflições nos causam. Uma ‘luz’ acintosa no ‘fim do túnel’ para quem deseja encontrá-la. Desse modo, perguntamos: O que é espiritualidade? Como podemos desenvolvê-la? Qual a sua importância para nós?
Traremos algumas respostas para tais questões a fim de que  as pessoas, sejam quem for e qual situação enfrentam  no presente momento de suas vidas, possam ter uma melhor compreensão e assim sejam ajudadas  para suportarem o momento difícil que atravessam. Questiona-se: o que é feito pelas Instituições e pelo sistema carcerário para promover esta espiritualidade? Há tal espiritualidade no sistema carcerário? É notório a necessidade de um trabalho especialmente voltada para este fim, trabalho este que deve ser realizado por pessoas comprometidas com a causa do próximo, que sejam ‘guiadas’ por Deus e aptas para tão importante ocupação, a fim de que tantas pessoas que estão em privação de liberdade, bem como as que se julgam ‘livres’ e saibam que possuem uma ‘inteligência’ espiritual e que devem estimular as mesmas. Assim poderão colher os ‘frutos’ do amor, paz, compreensão mútua, fraternidade, alegria e o da verdadeira ‘liberdade’.
Procuramos aqui, a partir das questões levantadas, contribuir com novas propostas que venham a possibilitar um maior conhecimento acerca do que seja espiritualidade e, consequentemente, que as pessoas que vivenciam o cotidiano carcerário(ou outros tipos de ‘prisão), possam desenvolvê-la o melhor possível, conscientizando-se que isto poderá lhes proporcionar um maior equilíbrio, tranqüilidade e paz consigo mesmo, além do fato de que tal condição poderá refletir num melhor relacionamento com os companheiros, com a família, amigos e funcionários das Instituições em que se encontram em privação de liberdade. Com certeza, quanto maior for o grau de ‘inteligência espiritual’ das pessoas,  menores serão os problemas a serem enfrentados por todos. É preciso que  todas as pessoas, sejam quem for, saibam que há um Deus que contempla a tudo e a todos, e que deseja que o encontrem para que sejam abençoados por Ele.
Os dias de hoje estão marcados pelas dificuldades e pelas complicações pertinentes à humanidade ‘pós-moderna’. Pobreza , fome , miséria, políticas públicas incapazes de deterem o crescimento de tais coisas, economia monopolizadora, especulativa, ‘escravista’ e ‘marginalizadora’,   a violência ‘epidêmica’ e crescente, a corrupção dos valores e das relações sociais, demonstram  o quadro decadente da humanidade. Entretanto, entre o ‘povo de Deus’ (a Igreja), nota-se uma certa frustração no que diz respeito à alienação aos problemas enfrentados pela humanidade. Incrível como os ‘fiéis’ prendem-se à ritos e doutrinas puramente religiosas sem compromisso com às necessidades humanas.
Não vamos encontrar nos textos bíblicos o termo ‘espiritualidade’. Nem se sabe ao certo sua gênese, embora tenha aparecido juntamente com as ‘organizações’ religiosas nos primeiros séculos da Igreja cristã. Hoje em dia, fala-se comumente que ser ‘espiritual’ é viver ‘religiosamente’ a vida cristã, ou seja, para ‘ser’ espiritual é preciso viver alienado às coisas materiais e ao mundo. No sentido bíblico, o termo ‘espiritualidade’ significa um viver ‘segundo o Espírito de Deus’. Podemos ver, desde os Patriarcas, passando pelos Juízes,  alguns Reis, Profetas, Jesus e os Apóstolos, pessoas ‘conduzidas’ pelo Espírito Santo para viverem conforme os ‘parâmetros’ de Deus e poderem executar com sucesso as ‘missões’ de cada um ‘ordenadas’ por Ele. Em outras palavras: a vida ‘segundo o Espírito’ não é estática, fria, presa à tradições ou à costumes religiosos, mas é viver livre de religiosidade, de forma profunda e dinâmica, no seguimento de Jesus, isto é, uma verdadeira ‘conversão’  ao estilo de vida segundo Cristo. É viver na busca de soluções para as necessidades da vida humana. Isto sim, é espiritualidade.
A espiritualidade representa uma ‘volta’ ao aspecto subjetivo e, de modo mais profundo, buscar captar os ‘fenômenos’ espirituais independentemente da lógica das palavras. O homem que busca e procura a Deus, descobre certas ‘vias’ para acessar ao conhecimento de Deus, através da espiritualidade. A pessoa humana é capaz de compreender a ordem das coisas estabelecidas pelo Criador, indo ao encontro do seu verdadeiro ‘bem’ – DEUS.
Só podemos viver plenamente a vida, se a vivermos intimamente relacionadas com Deus através da espiritualidade. Então estaremos na dimensão que Jesus deseja que alcancemos, pois devemos “adorar a Deus em espírito…” (C.f. . Jo 4,24)
6.1 – O SENTIDO  E A IMPORTÂNCIA DA ESPIRITUALIDADE
Não é muito fácil falar sobre espiritualidade. Busca-se, nos dias de hoje, uma espiritualidade que satisfaça, preencha, arrume ou que junte os ‘pedaços’ de nossas vidas. Nunca se viveu um momento em que nos são oferecidos inúmeras e variadas opções de ‘entretenimento’, visando o lazer, a diversão, o descanso da pesada rotina do cotidiano alucinante que nos é imposto pela sociedade ‘pós-moderna’ de nossos dias. O curioso é que, ao mesmo tempo, jamais as pessoas se sentiram tão vazias, ‘ocas’, sem-sentido. As opções que lhes oferecem não são suficientes, nem tampouco eficazes. Nos sentimos cada vez mais ‘sufocados’, mais ‘pressionados’, como que estivéssemos carregando pesados fardos em nossos corações, ao invés de ser nas costas, o que aumenta ainda mais a sensação de incômodo, de fadiga, de aperto no peito. Um dia chama o outro, a noite chama a próxima, os dias vão e vêm, assim como os meses e os anos. O tempo parece ser cada vez menor, tem-se a impressão que estamos sempre apressados e atrasados para alguma coisa. Também nos parece que as coisas nunca vão acontecer ou, então, demoram demasiadamente. É impressionante o ritmo alucinante em que a maioria das pessoas impõem ou se deixam impor às suas vidas. Somos cada vez mais intolerantes, estressados com as outras pessoas, ao mesmo tempo em que nos sentimos cada vez mais carentes, mais ‘ deprê ‘, mais exigente para que os outros nos compreendam, nos dê sua atenção, nos ajudem. Mas por quê estas coisas acontecem?
Porque as pessoas costumam reter suas aflições, seus suspiros, seus sofrimentos, suas dores, seus gemidos por aquilo que necessitam com urgência, algo que não se trata apenas de alimento, moradia, segurança, justiça, emprego, educação, paz, etc. Porque sentem falta de algo mais contigente, mais profundo: a espiritualidade. Nos dias atuais, vemos uma sociedade mercantilista, capitalista, consumista, imediatista, ‘neo-liberalista (quantos ‘istas’!), alienada e ‘super-cultuante’ do ‘ter’ ao invés do ‘ser’, e, ainda, ‘esfacelada’, insatisfeita e vazia de sentido. Nossa sociedade hodierna não consegue contemplar qual caminho precisa trilhar para ‘escapar’ do ritmo frenético em que vive, um caminho que possa lhe conduzir a um refúgio de paz, sossêgo, tranqüilidade, oração, um lugar de encontro consigo mesmo e com o Transcendente: DEUS.
Hoje em dia, tornou-se um grande desafio, para a maioria das pessoas, encontrar o caminho que lhes possam levar à transcender para a paz. A espiritualidade nos traz ‘condensação’, densidade, estímulo, sentido, emancipação, direção e perspectiva à vida humana. Observando as pessoas que vivem em situação miserável, tais como os ‘sem-teto’, menores abandonados, favelados, presidiários e ex-presidiários, etc., podemos ver que tais pessoas sofrem muito por causa da situação em que se encontram, mas podemos ver também que encaram a situação em que vivem de uma forma bem-humorada, até brincando com a mesma. Por outro lado, vemos, nos supostos lugares em que as coisas deveriam ser melhores (inclusive mais repleto de espiritualidade), uma certa ‘euforia’ por parte dos ‘irmãos’ que rezam (ou oram), cantam, pulam, batem palmas, gritam de ‘júbilo’ (até dançam!), ao tentarem propagar uma certa espiritualidade durante os cultos e as cerimônias, embora não vejamos tal prática vivenciada no cotidiano fora dos templos e das congregações. Até mesmo é difícil encontrar tais irmãos no dia-a-dia, nas ruas. Parecem até que são ‘agentes secretos’ das religiões. A respeito disto, surgem os questionamentos: Será que somente há espaço para a verdadeira espiritualidade nos locais de cultos ou de cerimônia religiosas? Por quê as pessoas costumam ligar espiritualidade à religiosidade? Por quê achamos que onde há miséria, opressão, desordem, não pode haver espiritualidade? Será que os pobres, oprimidos, marginalizados, presidiários, ex-presidiários, estão privadas de vivenciarem a espiritualidade?
Precisamos sair das ‘prisões’ que nós mesmos nos impomos, e das ‘muralhas’ que construímos, em que tais coisas apenas servem para nos afastarmos dos outros, e, por conseguinte, de Deus. O que precisamos é tomar posse daquilo que Paulo diz: “Todos os que são guiados pelo Espírito de Deus são filhos de Deus. E vocês não receberam um Espírito de escravos para recair no medo, mas receberam um Espírito de filhos adotivos, por meio do qual clamamos: Abba! Pai!”[1]
E, ainda: “De fato, Deus não nos deu um Espírito de medo, mas um Espírito de força, de amor e de sabedoria.”[2]
Desse modo, sairemos da nossa ‘timidez’ espiritual e da nossa alienação religiosa, e deixar de acreditar que por meras orações (ou rezas), músicas ‘gospel’ ou sacras e afins,  nos levarão ao Absoluto. Precisamos nos purificar do ‘lixo’ depositado na ‘rampa’ dos nossos corações (hipocrisia, preconceito, discriminação, etc.), para termos acesso ao caminho que nos leva à verdadeira espiritualidade: JESUS. Lembrem-se do que Ele disse: “Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida.”[3]
A verdadeira espiritualidade nada mais é do que ter fé na vida, principalmente quando as coisas não estão indo muito bem. A nossa breve existência, com os seus revezes e suas alegrias, com as nossas quedas e fraquezas, precisa ser vivida ao máximo, em que não podemos ter o luxo de perdemos tempo com futilidades. O ‘show da vida’ tem que continuar, apesar dos pesares. A espiritualidade deve estar ligada à condição e à situação da vida humana.
A maioria das pessoas que estão em privação de liberdade, não estão apenas privadas do direito de ‘ir e vir’. Estamos privados de uma alimentação decente, de atendimento médico, jurídico, da companhia dos amigos, familiares e parentes, de trabalho, de educação, etc. No entanto, a vida precisa e tem que continuar, seja qual for a situação em que possamos nos encontrar. Prova disso, é que hoje estamos desenvolvendo este trabalho, porque temos fé na vida, e fé que ainda existe sentido de viver. Por termos fé, e fé em Deus, apesar da restrição do espaço físico e da privação de liberdade, não nos conduzimos e nem deixamos nos conduzir à barbárie, como muitas pessoas pensam. Ao contrário, mesmo privados de muitas coisas, continuamos lutando para uma vida melhor para nós que fazemos esta obra, e para aquelas pessoas que não desistiram de viver. Graças a Deus, que Ele não privou ninguém da Sua Graça, do Seu Amor, da Sua Bondade, da Sua Misericórdia, da Sua Compaixão. Muitas pessoas olham para aqueles que estão nas prisões com os olhos ‘atravessados’, mas, felizmente, “Deus não vê como o homem(…)” [4]. Muitos acham que a prisão não é um local adequado para se vivenciar a espiritualidade. Mais uma vez recorremos à Palavra de Deus:  “(…)mas, onde foi grande o pecado, foi bem maior a Graça…”[5]
Deus não se encontra fora e nem sem o mundo. O nosso Deus é ‘invisível’, mas real e nos acompanha em nossa caminhada todos os dias. Não se pode conhecer este Deus se não estivermos intensamente ligados a Ele numa profunda e sincera espiritualidade. Somente O conheceremos se assumirmos os desafios que a vida nos apresenta, em que neles poderemos ver a Face do Ressucitado – Jesus Cristo – ícone do amor, da justiça, da paz, do perdão, da Graça e da esperança para os que sofrem. É o Deus Filho que venceu a cruz e se faz presente no meio das pessoas oprimidas, presença esta que faz com que nossa esperança seja renovada a cada dia.
Todavia, estas coisas só acontecerão se estivermos vivendo no Espírito de Deus, o qual nos faz reconhecer que somos livres por sermos “criados à sua imagem e semelhança”(Gn 1,27), que somos seus ‘filhos’ e ‘irmãos’ uns dos outros. Quando andamos no seguimento de Jesus, somos levados ao encontro com o Deus Pai, ao mesmo tempo em que somos ‘capacitados’ para executarmos nossa missão como cristãos. Por causa disto, constantemente devemos nos perguntar a respeito daquilo que Deus requer de nós neste mundo cheio de conflitos no qual vivemos.
O desenvolvimento de nossa espiritualidade nos ajuda a romper as estruturas de poder que encontram-se dentro de nós. Faz com que possamos derrubar as ‘muralhas’ do orgulho, da ira, da vaidade, da inveja, do rancor, do preconceito, da discriminação, da indiferença, etc. Para tal desenvolvimento, precisamos “olhar para Jesus, Autor e Consumador da nossa fé”  (Hb 12,2), o nosso ‘ponto de partida’. A fé em Jesus Cristo é o que precisamos para que tenhamos sucesso em nossa missão cristã. Aliás, a missão de evangelizar é o mister da Igreja cristã, pois o próprio Jesus nos comissionou para tal evangelização, ao ordenar:  “Portanto, vão e façam com que todos os povos se tornem meus discípulos(…)”[6]
Desse modo, a espiritualidade é um incentivo para que nos ‘alistemos’ ao ‘exército’ de Cristo, dando continuidade ao Seu projeto de libertação e de salvação aos que necessitam. Pela espiritualidade traçamos o caminho que nos leva à servir os ‘irmãos’. Por ela, somos ‘livres’ para exercermos nossa liberdade em Cristo, expressando para as pessoas que sabemos ser amados incondicionalmente por Ele, e que tal amor é ofertado para todas as pessoas, sejam quem for.
Pela espiritualidade somos feitos ‘militantes’ do Reino de Deus, comprometidos com as necessidades do povo, principalmente os mais pobres e oprimidos. É fundamental entender a mensagem cristã e conhecer as necessidades das pessoas. Como ‘obreiros’ de Jesus, tal como Ele, devemos ser os ‘porta-vozes’ da esperança, trabalhar com a finalidade de que o povo tenha sua esperança realizada e podermos construir um mundo melhor. Pela espiritualidade ainda podemos nos sentir pessoas melhores, alegres, cheias de ternura, de amor, ‘mensageiros’ da Palavra de Deus, sempre trabalhando para que se tenha um novo mundo, livre das desigualdades e das injustiças. Para isto, precisamos estar revestidos de um sério compromisso com a vida humana e em espírito de oração, outro poderoso instrumento para o desenvolvimento e exercício da espiritualidade. Pela oração, fazemos ‘contato’ direto com o Deus Pai, fortalecemos nossa espiritualidade e assumimos verdadeiramente o nosso papel de verdadeiros cristãos, seguidores de Jesus Cristo.
Ser espiritual não significa estar alienado do mundo. Não significa estar horas a fio em ‘meditação’. Ser espiritual é estar consciente dos conflitos do mundo e da vida humana, é sofrer com os que sofrem, sorrir com os que sorriem, chorar com os que choram. Em outras palavras, a espiritualidade nada mais é do que se sentir vivo e viver a vida com vida. A espiritualidade é importante por que nos faz sentir humano, situado numa realidade concreta, e não num ‘conto de fadas’, mas somos plenamente conscientes de nossas virtudes e dos nossos defeitos, daquilo que podemos fazer para melhorar não apenas a nossa condição de vida, mas principalmente a dos outros.
[1] Rm 8, 14-15.
[2] 2 Tm 1, 7.
[3] Jo 14, 6a.
[4] C.f. 2 Sm 16, 7
[5] C.f. Rm 5, 20.

[6] C.f. Mateus 28,19.

sexta-feira, 21 de março de 2014

A ESPIRITUALIDADE DOS NOSSOS DIAS


Espiritualidade
Os dias de hoje são cheios de intranquilidades e angústias no cenário mundial. Em todas as nações, das mais às menos desenvolvidas, existem problemas ligados à falta de amor, paz, justiça, entendimento, humildade, dentre outros valores. Percebe-se que há uma supremacia dos valores materiais sobre os espirituais, e em conseqüência disso, o ‘caos’ que envolve todo o mundo. Em nossa sociedade hodierna encontramos clamores que anseiam por paz e amor, mas não se percebe uma iniciativa da própria sociedade pra promover tais valores. A questão da espiritualidade é muitas vezes confundida com a religião, doutrina, dogma ou seita. A espiritualidade não é vista como algo de suma importância, pois alguém que tenha a sua ‘espiritualidade’ em dia será uma pessoa consciente dos valores necessários para o bem comum. Ser ‘espiritual’ não é o mesmo que ser religioso, mas ser revestido como uma ‘luz’ que clareia a escuridão das ‘trevas’ que nossas angústias e aflições nos causam. Uma ‘luz’ acintosa no ‘fim do túnel’ para quem deseja encontrá-la. Desse modo, perguntamos: O que é espiritualidade? Como podemos desenvolvê-la? Qual a sua importância para nós? Traremos algumas respostas para tais questões a fim de que as pessoas, sejam quem for e qual situação enfrentam no presente momento de suas vidas, possam ter uma melhor compreensão e assim sejam ajudadas para suportarem o momento difícil que atravessam. Questiona-se: o que é feito pelas Instituições e pelo sistema carcerário para promover esta espiritualidade? Há tal espiritualidade no sistema carcerário? É notório a necessidade de um trabalho especialmente voltada para este fim, trabalho este que deve ser realizado por pessoas comprometidas com a causa do próximo, que sejam ‘guiadas’ por Deus e aptas para tão importante ocupação, a fim de que tantas pessoas que estão em privação de liberdade, bem como as que se julgam ‘livres’ e saibam que possuem uma ‘inteligência’ espiritual e que devem estimular as mesmas. Assim poderão colher os ‘frutos’ do amor, paz, compreensão mútua, fraternidade, alegria e o da verdadeira ‘liberdade’. Procuramos aqui, a partir das questões levantadas, contribuir com novas propostas que venham a possibilitar um maior conhecimento acerca do que seja espiritualidade e, consequentemente, que as pessoas que vivenciam o cotidiano carcerário(ou outros tipos de ‘prisão), possam desenvolvê-la o melhor possível, conscientizando-se que isto poderá lhes proporcionar um maior equilíbrio, tranqüilidade e paz consigo mesmo, além do fato de que tal condição poderá refletir num melhor relacionamento com os companheiros, com a família, amigos e funcionários das Instituições em que se encontram em privação de liberdade. Com certeza, quanto maior for o grau de ‘inteligência espiritual’ das pessoas, menores serão os problemas a serem enfrentados por todos. É preciso que todas as pessoas, sejam quem for, saibam que há um Deus que contempla a tudo e a todos, e que deseja que o encontrem para que sejam abençoados por Ele. Os dias de hoje estão marcados pelas dificuldades e pelas complicações pertinentes à humanidade ‘pós-moderna’. Pobreza , fome , miséria, políticas públicas incapazes de deterem o crescimento de tais coisas, economia monopolizadora, especulativa, ‘escravista’ e ‘marginalizadora’, a violência ‘epidêmica’ e crescente, a corrupção dos valores e das relações sociais, demonstram o quadro decadente da humanidade. Entretanto, entre o ‘povo de Deus’ (a Igreja), nota-se uma certa frustração no que diz respeito à alienação aos problemas enfrentados pela humanidade. Incrível como os ‘fiéis’ prendem-se à ritos e doutrinas puramente religiosas sem compromisso com às necessidades humanas. Não vamos encontrar nos textos bíblicos o termo ‘espiritualidade’. Nem se sabe ao certo sua gênese, embora tenha aparecido juntamente com as ‘organizações’ religiosas nos primeiros séculos da Igreja cristã. Hoje em dia, fala-se comumente que ser ‘espiritual’ é viver ‘religiosamente’ a vida cristã, ou seja, para ‘ser’ espiritual é preciso viver alienado às coisas materiais e ao mundo. No sentido bíblico, o termo ‘espiritualidade’ significa um viver ‘segundo o Espírito de Deus’. Podemos ver, desde os Patriarcas, passando pelos Juízes, alguns Reis, Profetas, Jesus e os Apóstolos, pessoas ‘conduzidas’ pelo Espírito Santo para viverem conforme os ‘parâmetros’ de Deus e poderem executar com sucesso as ‘missões’ de cada um ‘ordenadas’ por Ele. Em outras palavras: a vida ‘segundo o Espírito’ não é estática, fria, presa à tradições ou à costumes religiosos, mas é viver livre de religiosidade, de forma profunda e dinâmica, no seguimento de Jesus, isto é, uma verdadeira ‘conversão’ ao estilo de vida segundo Cristo. É viver na busca de soluções para as necessidades da vida humana. Isto sim, é espiritualidade. A espiritualidade representa uma ‘volta’ ao aspecto subjetivo e, de modo mais profundo, buscar captar os ‘fenômenos’ espirituais independentemente da lógica das palavras. O homem que busca e procura a Deus, descobre certas ‘vias’ para acessar ao conhecimento de Deus, através da espiritualidade. A pessoa humana é capaz de compreender a ordem das coisas estabelecidas pelo Criador, indo ao encontro do seu verdadeiro ‘bem’ – DEUS. Só podemos viver plenamente a vida, se a vivermos intimamente relacionadas com Deus através da espiritualidade. Então estaremos na dimensão que Jesus deseja que alcancemos, pois devemos “adorar a Deus em espírito…” (C.f. . Jo 4,24) 6.1 – O SENTIDO E A IMPORTÂNCIA DA ESPIRITUALIDADE Não é muito fácil falar sobre espiritualidade. Busca-se, nos dias de hoje, uma espiritualidade que satisfaça, preencha, arrume ou que junte os ‘pedaços’ de nossas vidas. Nunca se viveu um momento em que nos são oferecidos inúmeras e variadas opções de ‘entretenimento’, visando o lazer, a diversão, o descanso da pesada rotina do cotidiano alucinante que nos é imposto pela sociedade ‘pós-moderna’ de nossos dias. O curioso é que, ao mesmo tempo, jamais as pessoas se sentiram tão vazias, ‘ocas’, sem-sentido. As opções que lhes oferecem não são suficientes, nem tampouco eficazes. Nos sentimos cada vez mais ‘sufocados’, mais ‘pressionados’, como que estivéssemos carregando pesados fardos em nossos corações, ao invés de ser nas costas, o que aumenta ainda mais a sensação de incômodo, de fadiga, de aperto no peito. Um dia chama o outro, a noite chama a próxima, os dias vão e vêm, assim como os meses e os anos. O tempo parece ser cada vez menor, tem-se a impressão que estamos sempre apressados e atrasados para alguma coisa. Também nos parece que as coisas nunca vão acontecer ou, então, demoram demasiadamente. É impressionante o ritmo alucinante em que a maioria das pessoas impõem ou se deixam impor às suas vidas. Somos cada vez mais intolerantes, estressados com as outras pessoas, ao mesmo tempo em que nos sentimos cada vez mais carentes, mais ‘ deprê ‘, mais exigente para que os outros nos compreendam, nos dê sua atenção, nos ajudem. Mas por quê estas coisas acontecem? Porque as pessoas costumam reter suas aflições, seus suspiros, seus sofrimentos, suas dores, seus gemidos por aquilo que necessitam com urgência, algo que não se trata apenas de alimento, moradia, segurança, justiça, emprego, educação, paz, etc. Porque sentem falta de algo mais contigente, mais profundo: a espiritualidade. Nos dias atuais, vemos uma sociedade mercantilista, capitalista, consumista, imediatista, ‘neo-liberalista (quantos ‘istas’!), alienada e ‘super-cultuante’ do ‘ter’ ao invés do ‘ser’, e, ainda, ‘esfacelada’, insatisfeita e vazia de sentido. Nossa sociedade hodierna não consegue contemplar qual caminho precisa trilhar para ‘escapar’ do ritmo frenético em que vive, um caminho que possa lhe conduzir a um refúgio de paz, sossêgo, tranqüilidade, oração, um lugar de encontro consigo mesmo e com o Transcendente: DEUS. Hoje em dia, tornou-se um grande desafio, para a maioria das pessoas, encontrar o caminho que lhes possam levar à transcender para a paz. A espiritualidade nos traz ‘condensação’, densidade, estímulo, sentido, emancipação, direção e perspectiva à vida humana. Observando as pessoas que vivem em situação miserável, tais como os ‘sem-teto’, menores abandonados, favelados, presidiários e ex-presidiários, etc., podemos ver que tais pessoas sofrem muito por causa da situação em que se encontram, mas podemos ver também que encaram a situação em que vivem de uma forma bem-humorada, até brincando com a mesma. Por outro lado, vemos, nos supostos lugares em que as coisas deveriam ser melhores (inclusive mais repleto de espiritualidade), uma certa ‘euforia’ por parte dos ‘irmãos’ que rezam (ou oram), cantam, pulam, batem palmas, gritam de ‘júbilo’ (até dançam!), ao tentarem propagar uma certa espiritualidade durante os cultos e as cerimônias, embora não vejamos tal prática vivenciada no cotidiano fora dos templos e das congregações. Até mesmo é difícil encontrar tais irmãos no dia-a-dia, nas ruas. Parecem até que são ‘agentes secretos’ das religiões. A respeito disto, surgem os questionamentos: Será que somente há espaço para a verdadeira espiritualidade nos locais de cultos ou de cerimônia religiosas? Por quê as pessoas costumam ligar espiritualidade à religiosidade? Por quê achamos que onde há miséria, opressão, desordem, não pode haver espiritualidade? Será que os pobres, oprimidos, marginalizados, presidiários, ex-presidiários, estão privadas de vivenciarem a espiritualidade? Precisamos sair das ‘prisões’ que nós mesmos nos impomos, e das ‘muralhas’ que construímos, em que tais coisas apenas servem para nos afastarmos dos outros, e, por conseguinte, de Deus. O que precisamos é tomar posse daquilo que Paulo diz: “Todos os que são guiados pelo Espírito de Deus são filhos de Deus. E vocês não receberam um Espírito de escravos para recair no medo, mas receberam um Espírito de filhos adotivos, por meio do qual clamamos: Abba! Pai!”[1] E, ainda: “De fato, Deus não nos deu um Espírito de medo, mas um Espírito de força, de amor e de sabedoria.”[2] Desse modo, sairemos da nossa ‘timidez’ espiritual e da nossa alienação religiosa, e deixar de acreditar que por meras orações (ou rezas), músicas ‘gospel’ ou sacras e afins, nos levarão ao Absoluto. Precisamos nos purificar do ‘lixo’ depositado na ‘rampa’ dos nossos corações (hipocrisia, preconceito, discriminação, etc.), para termos acesso ao caminho que nos leva à verdadeira espiritualidade: JESUS. Lembrem-se do que Ele disse: “Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida.”[3] A verdadeira espiritualidade nada mais é do que ter fé na vida, principalmente quando as coisas não estão indo muito bem. A nossa breve existência, com os seus revezes e suas alegrias, com as nossas quedas e fraquezas, precisa ser vivida ao máximo, em que não podemos ter o luxo de perdemos tempo com futilidades. O ‘show da vida’ tem que continuar, apesar dos pesares. A espiritualidade deve estar ligada à condição e à situação da vida humana. A maioria das pessoas que estão em privação de liberdade, não estão apenas privadas do direito de ‘ir e vir’. Estamos privados de uma alimentação decente, de atendimento médico, jurídico, da companhia dos amigos, familiares e parentes, de trabalho, de educação, etc. No entanto, a vida precisa e tem que continuar, seja qual for a situação em que possamos nos encontrar. Prova disso, é que hoje estamos desenvolvendo este trabalho, porque temos fé na vida, e fé que ainda existe sentido de viver. Por termos fé, e fé em Deus, apesar da restrição do espaço físico e da privação de liberdade, não nos conduzimos e nem deixamos nos conduzir à barbárie, como muitas pessoas pensam. Ao contrário, mesmo privados de muitas coisas, continuamos lutando para uma vida melhor para nós que fazemos esta obra, e para aquelas pessoas que não desistiram de viver. Graças a Deus, que Ele não privou ninguém da Sua Graça, do Seu Amor, da Sua Bondade, da Sua Misericórdia, da Sua Compaixão. Muitas pessoas olham para aqueles que estão nas prisões com os olhos ‘atravessados’, mas, felizmente, “Deus não vê como o homem(…)” [4]. Muitos acham que a prisão não é um local adequado para se vivenciar a espiritualidade. Mais uma vez recorremos à Palavra de Deus: “(…)mas, onde foi grande o pecado, foi bem maior a Graça…”[5] Deus não se encontra fora e nem sem o mundo. O nosso Deus é ‘invisível’, mas real e nos acompanha em nossa caminhada todos os dias. Não se pode conhecer este Deus se não estivermos intensamente ligados a Ele numa profunda e sincera espiritualidade. Somente O conheceremos se assumirmos os desafios que a vida nos apresenta, em que neles poderemos ver a Face do Ressucitado – Jesus Cristo – ícone do amor, da justiça, da paz, do perdão, da Graça e da esperança para os que sofrem. É o Deus Filho que venceu a cruz e se faz presente no meio das pessoas oprimidas, presença esta que faz com que nossa esperança seja renovada a cada dia. Todavia, estas coisas só acontecerão se estivermos vivendo no Espírito de Deus, o qual nos faz reconhecer que somos livres por sermos “criados à sua imagem e semelhança”(Gn 1,27), que somos seus ‘filhos’ e ‘irmãos’ uns dos outros. Quando andamos no seguimento de Jesus, somos levados ao encontro com o Deus Pai, ao mesmo tempo em que somos ‘capacitados’ para executarmos nossa missão como cristãos. Por causa disto, constantemente devemos nos perguntar a respeito daquilo que Deus requer de nós neste mundo cheio de conflitos no qual vivemos. O desenvolvimento de nossa espiritualidade nos ajuda a romper as estruturas de poder que encontram-se dentro de nós. Faz com que possamos derrubar as ‘muralhas’ do orgulho, da ira, da vaidade, da inveja, do rancor, do preconceito, da discriminação, da indiferença, etc. Para tal desenvolvimento, precisamos “olhar para Jesus, Autor e Consumador da nossa fé” (Hb 12,2), o nosso ‘ponto de partida’. A fé em Jesus Cristo é o que precisamos para que tenhamos sucesso em nossa missão cristã. Aliás, a missão de evangelizar é o mister da Igreja cristã, pois o próprio Jesus nos comissionou para tal evangelização, ao ordenar: “Portanto, vão e façam com que todos os povos se tornem meus discípulos(…)”[6] Desse modo, a espiritualidade é um incentivo para que nos ‘alistemos’ ao ‘exército’ de Cristo, dando continuidade ao Seu projeto de libertação e de salvação aos que necessitam. Pela espiritualidade traçamos o caminho que nos leva à servir os ‘irmãos’. Por ela, somos ‘livres’ para exercermos nossa liberdade em Cristo, expressando para as pessoas que sabemos ser amados incondicionalmente por Ele, e que tal amor é ofertado para todas as pessoas, sejam quem for. Pela espiritualidade somos feitos ‘militantes’ do Reino de Deus, comprometidos com as necessidades do povo, principalmente os mais pobres e oprimidos. É fundamental entender a mensagem cristã e conhecer as necessidades das pessoas. Como ‘obreiros’ de Jesus, tal como Ele, devemos ser os ‘porta-vozes’ da esperança, trabalhar com a finalidade de que o povo tenha sua esperança realizada e podermos construir um mundo melhor. Pela espiritualidade ainda podemos nos sentir pessoas melhores, alegres, cheias de ternura, de amor, ‘mensageiros’ da Palavra de Deus, sempre trabalhando para que se tenha um novo mundo, livre das desigualdades e das injustiças. Para isto, precisamos estar revestidos de um sério compromisso com a vida humana e em espírito de oração, outro poderoso instrumento para o desenvolvimento e exercício da espiritualidade. Pela oração, fazemos ‘contato’ direto com o Deus Pai, fortalecemos nossa espiritualidade e assumimos verdadeiramente o nosso papel de verdadeiros cristãos, seguidores de Jesus Cristo. Ser espiritual não significa estar alienado do mundo. Não significa estar horas a fio em ‘meditação’. Ser espiritual é estar consciente dos conflitos do mundo e da vida humana, é sofrer com os que sofrem, sorrir com os que sorriem, chorar com os que choram. Em outras palavras, a espiritualidade nada mais é do que se sentir vivo e viver a vida com vida. A espiritualidade é importante por que nos faz sentir humano, situado numa realidade concreta, e não num ‘conto de fadas’, mas somos plenamente conscientes de nossas virtudes e dos nossos defeitos, daquilo que podemos fazer para melhorar não apenas a nossa condição de vida, mas principalmente a dos outros. [1] Rm 8, 14-15. [2] 2 Tm 1, 7. [3] Jo 14, 6a. [4] C.f. 2 Sm 16, 7 [5] C.f. Rm 5, 20. [6] C.f. Mateus 28,19.


Escola Érico Veríssimo / Santa Maria/RS